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[CRÍTICA] [INKA CLOWN]

 

Foto: Nityama Macrini  

O artista circense e clown Atawalpa Coello está diante da roda de estudantes, que ocupou a quadra do CÉU das Artes, no Recanto das Emas, quando uma espectadora comenta em voz alta: “Ele me lembra o Charles Chaplin”.

A figura poética do inesquecível palhaço é visivelmente evocada nos primeiros instantes de “InKa Clown” numa fisicalidade, sobretudo, que dialoga com o tipo mítico consagrado pelo cinema. Não se trata de uma caricatura, mas de uma energia corporal estabelecida. Essa potência, no entanto, desfaz-se intencionalmente quando o artista assume a voz e apresenta-se ao público.

De alguma maneira, quebra-se uma “magia” porque Atawalpa Coello detém uma capacidade inconteste de emocionar e fazer rir com olhares, gestualidades e máscaras faciais. O silêncio parece lhe dar potência. Talvez, aí resista a fragilidade de “Inka Clown”: a dramaturgia proposta.  

À trilha sonora excessiva e óbvia (“Pantera Cor de Rosa”, “Batman”, “Psicose”), soma-se uma quantidade frenética de gags, sufocando a narrativa poética que a figura de Atawalpa Coello propõe no tempo inicial. Números criativos que poderiam ser melhor estabelecidos no tempo-espaço, como a Lhamita (a lhama acrobata), ficam imprensados entre um e outro quadro sem o mesmo apelo e importância. O mesmo acontece quando ele retira de sua mala uma clarineta e, ao vivo, comanda um show com a roda de espectadores, num dos melhores momentos do espetáculo.

Sem respiros, “InKa Clown” desloca-se dos minutos iniciais poéticos para um solo veloz que se segura firme graças ao talento e vigor do artista peruano radicado em Brasília. Atawalpa Coello adequa uma série de números acrobáticos e de equilíbrio à estrutura participativa da plateia. Tira proveito fácil dos erros dos escolhidos e faz a plateia se dobrar de rir na construção de um espetáculo de tons festivos.

Não deixa de criar uma figura afetiva, agridoce e carismática. Independentemente do tom, a montagem faz a plateia sair em estado de felicidade. “Inka Clown” cumpre um papel de qualidade e de entretenimento, marcas da ótima Cia. Circo Rebote (DF). Porém, deixa àquela sensação que poderia ter tocado em âmbitos poéticos que Chaplin acessava com maestria. Não há dúvidas que Atawalpa Coello mergulharia, com coragem, nesse universo sensível como se lançasse de braçadas ao mar aberto.

Sérgio Maggio.

* Sérgio Maggio é mestre em crítica teatral pela UnB e diretor-dramaturgo do Criaturas Alaranjadas Núcleo de Criação Continuada

Publicado em 22 de agosto de 2018