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[CRÍTICA] [DINAMARCA]

Foto: Thiago Sabino

Para tratar da alienação de classes mais privilegiadas e um total descaso com os problemas externos o grupo pernambucano Magiluth decidiu se aventurar em busca de um hygge perfeito. A expressão dinamarquesa, difícil de ser traduzida ao pé da letra, significa algo semelhante a conforto ou aconchego, situação buscada pelos integrantes da festa de casamento cheia de aparências. Distraído, o pequeno grupo busca contemplar apenas os próprios prazeres, enquanto evita falar de assuntos mais espinhosos para não atrapalhar as boas vibrações do corpo e do ambiente.

O elenco mostra-se forte e vigoroso em cena, mas a quantidade excessiva de símbolos e abstrações abala a conexão eficaz com o público em diversos instantes. Em cena, a narrativa não linear trata de colocar o dedo na ferida da eterna busca pela autossatisfação. Esqueça-se do mundo, há coisas demais para arrumar entre o próprio deleite e as comemorações cotidianas.

O constante vai e vem dos atores em cena nos transporta às ações mecânicas e irrelevantes que reproduzimos dia após dia, sem cessar. Um emaranhado de caos e pequenas organizações para manter a mente sempre ocupada e não permitir espaço ao questionamento. O tema é atual e dialoga bem no que se propõe. Sinto falta de conhecer um pouco melhor aqueles personagens e o que mais guardam além da energia da grande festa.

A cenografia e a iluminação são simples, mas dialogam bem com o tema proposto. A montagem desconstrói a cerimônia de casamento tão esperada por uma representativa elite que prefere se desconectar dos problemas que a cercam. A crítica social é percebida aos poucos e é possível nos reconhecer em alguns daqueles tantos instantes de completa alienação. Afinal, para que esquentar a cabeça? Vamos comemorar!

No grupo, uma teia de aparências é construída entre aquelas breves relações. Apesar do riso constante, da dança e da busca pelo hyggy, logo entendemos que os conflitos internos e coletivos são maiores do que se permitem demonstrar. Um respiro e um sorriso para manter as aparências. Depois de uma crise de fúria, um instante de realidade leva um ou outro personagem novamente à busca pela convivência harmônica. Uma coreografia displicente e despretensiosa para esquecer os problemas e assim seguimos adiante.

Isabella de Andrade.

* Isabella de Andrade é escritora, atriz e jornalista, graduada em Comunicação Social (UnB) e Artes Cênicas (UnB). Publicou o livro Veracidade (2015) e participou da antologia poética Casa do Desejo – Literaturas que desejamos, lançada na Flip em 2018. Idealizadora do projeto oCiclorama (www.ociclorama.com)

Publicado em 30 de agosto de 2018